Neste ano de 2022 temos a oportunidade de visualizar e tentar entender o que a pandemia escancarou, como as dificuldades, os retrocessos, a falta de investimentos em infraestrutura, tecnologias, formação de professores, que impactam a real inexistência de projeto de educação para o Estado e para o município de Limeira (SP). 

Na edição do Jornal Pires Rural 305 (30/09/2022), a matéria “Escola do bairro dos Pires voltará classes multisseriadas depois de vinte anos”, retoma, na atual edição especial “Dia do Professor”, o assunto não pode passar despercebido em 2022, do século XXI, no Estado de São Paulo, no município de Limeira às margens da Via Anhanguera. 

A matéria traz a carência de salas de aulas para a atual demanda; traz o improviso de uma sala multiuso num almoxarifado, também usada por PCDs; o fato da unidade escolar constar como escola do campo, estabelecido na política nacional de educação do campo, sem ter um projeto. 

O bairro está situado numa região periurbana, na zona rural, mas apenas 8 % das 145 famílias com filhos matriculados na escola local, vivem e sobrevivem da renda agrícola, ou seja, nesse bairro não prevalece a agricultura familiar ou a vida do campo. 

O modelo de escola construído, nesse caso, tem ar condicionado, professores muito bem formados, tratamento de esgoto, um ambiente renovado e bem cuidado do ponto de vista estético e de materiais como projeto de robótica. Depois de vinte anos volta a ter um Projeto Político Pedagógico para classes multisseriadas. Que projeto de educação é esse? 

Foto: Alberto-g-rovi – commons.wikimedia.org

Na semana que se comemora o Dia das Crianças e o Dia do Professor, entrevistamos Edivaldo Mendes da Costa, secretário de assunto municipais da Apeoesp, subsede Limeira (SP), Iracemápolis (SP) e Cordeirópolis(SP). 

Acompanhe a entrevista; 

JPR: Você tem acompanhado a realidade da EMEIEFR Martin Lutero, tanto na demanda de procura por vagas quanto no investimento do município, na construção de duas novas salas de aula, em projeto arquitetônico construído em 2008? Essa demanda por uma expansão ou por uma construção de uma nova escola ainda persiste. O que acontece?

Edivaldo Mendes: A verba da Educação está sendo usada hoje, praticamente, para pagar salários, soma-se quase mil monitores na rede municipal de educação que a lei federal incluiu, reconhecidos como funcionários da educação. Existe recurso na pasta da Educação do município de Limeira, mas não foi feita uma boa aplicação pela gestão nos últimos anos. 

Tem que ser construído quatro salas de aulas na escola Martin Lutero, mas foram construídas apenas duas “meia boca”. A gente sempre cobrou a construção dessas salas de aula em reuniões com o Secretário da Educação, e em mesas de negociação, porque ali (bairro dos Pires) é uma região que está na pauta da nossa reivindicação, inclusive – não só ali, mas a periferia. Ali é uma região que a gente sabe que está crescendo, é visível o aumento do número de alunos. E aí, vai amontoando e vira um depósito (de alunos), se deixar. 

A proposta como solução em reunião colocada pelo Secretário da Educação antes da pandemia, foi de colocar salas de aula de estilo containers, você acredita? Nós fomos contra. Em 2019, a realidade já apontava que haveria uma explosão do número de pedidos de matrículas naquela escola. Por isso, nós tínhamos a ideia de sentar com a gestão, professores, famílias, para uma discussão do que seria o ideal para se ter uma projeção para o futuro. Não foi feito devido à pandemia e agora foram feitas duas salas que não dá conta da demanda. Um aumento de classes sem projeto e ainda teve que colocar dinheiro da arrecadação das famílias “parceria” porque a Secretaria sozinha não fez as duas salas. 

JPR: A Secretaria da Educação não investiu sozinha na construção de duas salas de aula?

Edivaldo Mendes: Não. A Escola teve que pôr recursos, arrecadar dinheiro, fazer eventos, se não, não saía a construção de duas salas de aula – um absurdo. Eles tinham a necessidade das salas e a Secretaria da Educação ficava enrolando e a escola deu uma contrapartida. 

A escola de hoje não é gratuita. Quando cobram colaboração espontânea para a Associação de Pais e Mestres (APM), quando pedem materiais que não é obrigatório, quando faz festas para arrecadar recursos, arrecadar dinheiro para realizar algo dentro da escola; a escola não está sendo 100% gratuita, porque está usando recursos da família, da comunidade. Mesmo porque quem banca tudo na educação é o contribuinte. 

JPR: O que deve ser feito diante da demanda em aberto? 

Edivaldo Mendes: Nós vamos cobrar, inclusive em mesa de negociação. Terá uma reunião de negociação ainda esse mês, vamos cobrar assim como fizemos no passado, continuar cobrando e exigindo, denunciando para construir mais duas salas, pelo menos. Acredito que tenha que ser três salas. Esse aumento de salas não atende bem as crianças, não dá qualidade ao atendimento, mesmo tendo recursos pra isso. A escola não tem uma quadra coberta, ali tinha que ser uma escola de ensino Infantil e construir uma outra maior para o ensino Fundamental. 

JPR: A escola Martin Lutero está designada como escola do campo dentro da política nacional de educação do campo. A unidade escolar se enquadra nos conceitos de escola do campo ?

Edivaldo Mendes: Como “escola do campo”, por estar situada na área rural, a escola recebe verba específica para o transporte dos funcionários para se locomoverem da cidade para o campo. E também, recebe verba específica para escolas que se identificam na zona rural, mas não é uma escola do campo. A Martin Lutero é uma escola com as características de cidade. A verba é boa, porque pode ser usada para algum atendimento especializado, para manter as características de zona rural – para um trabalho diferenciado com a criança que é dessa área rural, dá pra fazer, não é ruim. Mas a Martin Lutero não é uma escola do campo. 

JPR: Dá pra aceitar a educação multisseriada em nosso município, em 2022? 

Edivaldo Mendes: Veja, estamos na semana da criança e do professor e ainda, temos essa situação. Mesmo com tantos recursos disponíveis e tendo desvio dos recursos da educação para pagar a empresa de transporte público do município, (o município) tendo que pagar bônus para o professor, porque não deu reajuste salarial, não aplicou os 25% (mínimo esperado) que teria que aplicar e, no ano passado não foi feito, por isso sobrou dinheiro. 

O que está acontecendo é uma ingerência do dinheiro público na educação do município. O dinheiro que sobrou da pasta da Educação foi aplicado no transporte público o Secretário não explica de onde sobrou. Se temos que reformar e construir escolas, até o prédio da Secretaria da Educação está decadente, horrível -, foi comprado um monte de brinquedos, computadores, porque não usou os 25% que teria que ter sido usado dos recursos próprios da prefeitura na educação. Como ele não fez, agora está “queimando” com brinquedos e materiais que faltou por anos. Trata-se de uma ingerência na aplicação do dinheiro público. 

Existe uma carência das crianças nessa região da escola Martin Lutero. Parece que não, mas temos um número de crianças carentes naquela região, em loteamentos que antes era uma fazenda, virou pequeno sítio e virou lotes de 500m, está virando uma favelinha. 

Eu vejo na região, crianças em condições que não são dignas, infelizmente. São famílias que não tem estrutura para manter três ou quatro filhos, passando necessidades e recebendo ajuda de um e de outro. Quem tem que fazer o papel social de atendimento das famílias carentes é a prefeitura. A escola pode fazer encaminhamentos. 

JPR: Qual é o projeto de educação dessa gestão pública para o município de Limeira ? 

Edivaldo Mendes: Como está no Plano Nacional, Estadual e Municipal da Educação, o que a gente brigou e construiu em conjunto, e que está em discussão agora na Conferência Conjunta de Educação Municipal (COCEM), é uma escola de qualidade, inclusiva para todos, laica (não estar ligada a essa ou aquela religião -, o que seria um absurdo) e pública. Essa escola tem que ser gradualmente ofertada em período integral, mas um período integral de qualidade com recursos para isso; não basta ter alunos na sala de aula, tem que sair do papel. 

Por conta da pandemia a gente cobrou muito o município de Limeira e o Estado porque a  educação está mudando, as famílias estão mudando e a gente não sabe o que virá pela frente. Já tivemos o H1N1, o novo coronavírus e se tivermos algo que afete à frente, como vamos sobreviver? Então, é preciso investir em formação, investir em tecnologias (só começou) para a inclusão digital dos estudantes, investimento em internet porque não temos, para trabalhar a formação dos estudantes para o mercado de trabalho. Hoje, nada disso está acontecendo, de fato. Não adianta ter plano e metas se não dá pra alcançar. O que tem acontecido é que sempre se empurra para o próximo governo. 

JPR: Considerações finais?

Edivaldo Mendes: Estamos na semana do professor e das crianças e adolescentes, quero destacar; o que está faltando muito, é a ideia do coletivo. Cada um está olhando para o seu umbigo, para os seus problemas, para a sua vida e, está esquecendo essa parte do coletivo, do social; que é o todo, que é o importante. 

A gente percebe que o coletivo está sendo deixado de lado, inclusive, quando realizamos as visitas, quando estamos conversando com os próprios funcionários da escola, com os professores. Eles estão muito preocupados com a sua vida pessoal, com as suas condições de vida profissional, com a sua formação, com o seu salário mas, estão esquecendo da luta coletiva, de trabalhar juntos para almejar uma melhoria para todos da educação, inclusive para a criança e para o adolescente, que é o fundamental da escola. Sem as crianças não teria sentido a escola e a educação. Não se pode separar ou segregar a educação pública.

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