A experiência da pandemia da Covid-19 nos leva a inúmeros questionamentos sobre a rotina e o lazer devido ao estresse de abandonar hábitos de uma vida inteira e, pelo fato do vírus nos impor mudanças. Neste momento em que necessitamos espairecer, vivenciar momentos de prazer, podemos avaliar como estamos lidando com o hobby e a importância do mesmo para a saúde mental. O hobby muitas vezes é a oportunidade de praticarmos nossos dons ou habilidades que foram deixados de lado, devido a uma escolha profissional, por exemplo. Quantos de nós teve que fazer a escolha profissional entre, a profissão que de fato gostava e tinha prazer, pela profissão que melhor remunerava. Então, o hobby sempre esteve associado ao prazer da prática, ao investimento de tempo e materiais, mas que, o resultado pessoal e coletivo vai muito além do consumo. 

Conversamos com Wagner Takada sobre a observação de aves, ele é fotógrafo, videomaker, e passarinheiro por paixão. O passarinheiro destaca seu interesse na observação das diferenças existentes em pássaros comuns como o bem-te-vi, os periquitos, os pombos, e chama a atenção de que é possível observarmos as características das aves somente com a disciplina da observação. A atividade sustentável da observação de aves tem como objetivo vigiar as aves em seu habitat natural, sem interferir no seu comportamento ou no seu ambiente. Passarinhar é uma atividade que pode ser praticada por qualquer pessoa, de crianças a idosos, em grupos ou individualmente, é divertido, incentiva a passear mais, estreitar laços de amizade e ter mais respeito com a natureza.

(Foto:wagner takada) Beija-flor-tesoura, espécie de grande porte e relativamente agressivo. É característico pela longa cauda bifurcada e coloração azul-arroxeada da cabeça, peito e nuca. Vive junto a bordas de alta, sendo comum até mesmo dentro de cidades.

JPR: Você me disse que observa pássaros por hobby. Fale como iniciou a observação, o que lhe motivou e a importância de mantermos um hobby para a saúde mental?

Takada: Eu sempre gostei de fotografar desde criança. E, sempre fui fascinado por gaviões e gostaria de fotografar um, principalmente o Carcará que é bem comum em todo Brasil. Tenho um amigo, o Flávio Moraes, que já está há mais de seis anos “passarinhando” e fotografando as aves e, adoro o trabalho dele. Mas, em 2018, eu estava ajudando uma amiga na horta da chácara dela e, no terreno ao lado, comecei a reparar em uma ave que sobrevoava a área e pairava no ar em busca de roedores e, em busca de pequenos ratos, mucuras, lagartos; pequenas aves e insetos. Era o gavião peneira, comum em campos com árvores ou áreas florestadas, permeadas de vegetação aberta. Fiquei encantado como pairava no ar para examinar o solo em busca de seus alimentos. E, nisso já fiquei empolgado e comprei uma teleobjetiva maior para conseguir fotografar esse bicho, mais próximo. E uma semana adiante, já apareceu uma coruja enorme, que nunca tinha visto ao vivo e, que divide ou disputa o mesmo espaço para caça com o gavião peneira, era a coruja mocho dos banhados. Lindissima!!! Foi assim que comecei esse hobby muito especial. 

(Foto:wagner takada) Tucanuçu, inconfundível pelo longo bico laranja-avermelhado, com base e mancha na ponta da maxila em cor negra. É o maior dos tucanos e, deferentemente de todos os outros, não é exclusivamente florestal. Vive em áreas mais abertas e bordas de mata. A espécie vem expandindo sua distribuição em função de desmatamentos.

JPR: Qual é a importância de um observador de aves participar de um grupo de estudos e observação de aves? 

Takada: A importância do observador participar de um grupo é que passarinhar nos inspira, nos conecta com o outro e com a natureza. Também é muito saudável a troca de experiências, lugares e até, em que ponto podemos encontrar determinada ave. Acredito que é um hobby muito saudável para sairmos da rotina e desligar um pouco do mundo virtual, que aumentou consideravelmente com a pandemia e da pressão que sofremos no trabalho. Já ouvi dizer que há pesquisas que onde dizem que “passarinhar” ajuda no combate ao stress e a ansiedade.

(Foto:wagner takada) Socozinho pode ser encontrado em praticamente qualquer área alagada, incluindo manguezais. Solitário, costuma caçar suas presas ficando empoleirado junto à vegetação ou caminhando águas rasas.

JPR: O que envolve a observação de aves, desde a disciplina do observador, até o investimento para o hobby e armazenamento das imagens. Que universo é esse? 

Takada: Para observar aves precisamos nada mais que atenção em nossa volta. Percebemos que existem mais que pardais, pombos, por todos os lados. Até mesmo que existem várias espécies de pombo e rolinha. Precisamos ficar atentos aos detalhes, comportamentos, cores e som das aves. O ideal é começar no bairro, quintal ou quando vai em uma chácara de conhecidos ou parentes. Uma ideia para começar a observar seria um guia de bolso assim, dá para ver e já identificar através do guia. Agora, se quiser começar com binóculos é bem interessante para observar mais os detalhes de cada pássaro. O ideal de binóculos são dois, tipos 8X42 ou 10X42. Se quiser começar a registrar fotos, há câmeras super zoom que são mais para amadores ou as DSRL ou Mirrorless que são câmeras mais sofisticadas e também mais caras. 

(Foto:wagner takada) Saíra sete cores, é ave facilmente encontrada na mata atlântica e quando vamos ao litoral sempre observamos facilmente.

JPR: Qual é o melhor horário, clima, época do ano, para praticar a observação? Você faz uso de oferta de alimentos para atrair os pássaros? 

Takada: O melhor horário para observação são as primeiras horas da manhã, horário em que os pássaros estão mais ativos. Para fazer o registro normalmente utilizamos o playback, que é o som da ave que avistamos, assim ela acredita que se trata de outra ave que está invadindo o seu território e acaba se aproximando mais, mas esse artifício deve ser usado com cautela e por alguém que já tenha mais experiência, pois dependendo da época a ave pode estar procriando e acaba saindo do ninho e deixando-o mais exposto a predadores. Outra maneira que se utiliza são os comedouros que podemos colocar frutas ou sementes para alimentar as aves assim, elas descem até ele e se torna mais fácil o trabalho do registro e observação. 

(Foto:wagner takada) Pica pau verde barrado, vive em matas de galeria, cerrados, cerradões, caatingas e na borda de florestas. É cada vez mais comum em áreas urbanas.

JPR: A identificação das aves observadas é realizada no local da observação ou por fotos em um momento pós-observação? 

Takada: A identificação pode ser feita através de guias de observação ou também através de aplicativos como o Merlin desenvolvido pelo laboratório de ornitologia de Cornell ou pelo excelente site brasileiro Wikiaves, onde você pode colocar seu registro fotográfico ou sonoro que (especialistas) voluntários ajudarão a identificar a espécie. 

(Foto:wagner takada) Pardal é uma espécie exótica, foi trazida da Europa, vive em pares ou em pequenos bandos, sempre em associação com o ser humano, evitando área naturais, ocorre em todo território brasileiro.

JPR: O que as aves livres despertam no ser humano? 

Takada: As aves nos conectam com a natureza e com o entorno em nossa volta. Elas nos inspiram, tanto fazendo fotos, numa tela de pintura ou até mesmo em canções, que há várias citações de aves por aí. 

(Foto:wagner takada) Lavadeira mascarada facilmente encontrada junto a rios ou lagoas, em parques e jardins de centros urbanos.

JPR: Você gosta de observar e registrar as diferentes características de uma mesma espécie. Conte-nos sobre esse olhar.

Takada: Com o tempo, você começa a reparar nos detalhes e variações de espécies. Por exemplo, o bem-te-vi, ele tem um topete amarelo que quase ninguém sabe, pois esse topete só enxergamos quando ele está se limpando ou quando está em uma disputa territorial com outro indivíduo. Também existem outras espécies de bem-te-vi, como bentevizinho de penacho vermelho, bentevizinho do brejo e ainda tem o neinei que se diferencia pelo canto e pelo bico. Eu poderia citar várias outras aves; os periquitos, os pombos, os gaviões. Às vezes são os detalhes que se diferenciam. 

(Foto:wagner takada) Caracará vive especialmente junto a áreas abertas, inclusive dentro de cidades. Peito e pescoço finamente estriados, bico azulado e cera laranja-avermelhada.

JPR: Hoje, o ser humano está atento a comunicação visual através do consumo de imagens inéditas o que infelizmente acaba banalizando o que é corriqueiro. Como trazer a importância da observação de pássaros que nos rodeiam no dia a dia para as crianças? Qual é o tamanho da importância dos pássaros comuns? 

Takada: O adulto traz a importância da observação a partir do próprio interesse. A observação de aves não é simplesmente enxergar-la, mas também, ouvi-la e identificar. Acredito que para identificar aves dedicamos 70% da audição. A criança vai observar o adulto se encantando pela ave e, será esse encanto que irá interessar a criança e mobiliza-la, interessar pela ave e, essa observação ser preenchida por uma experiência afetiva, inclusive.

(Foto:wagner takada) O bem-te-vi comum tem o nome (onomatopéico) por conta do canto, exibe também uma crista amarelo-ouro quando está se limpando ou quando está em uma disputa territorial com outro indivíduo. O neinei tem o bico mais comprimido e robusto, sem contar que o canto também é bem diferente ao do bem-te-vi comum. Bentevizinho de penacho vermelho como o nome diz ele é menor e o canto é totalmente diferente do bem-te-vi comum.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *