Paulo Godoy é do ramo de bares e restaurantes, nas cidades de Amparo e na capital paulista. Ele é um dos idealizadores do Festival da Cachaça do Circuito das Águas Paulista e diz, “eu sempre trabalhei com cachaça, gosto, e estou há muitos anos no ramo, comecei com discoteca, sou da noite há 30 anos. Já morei em São Carlos, SP, tive bar em Ribeirão Preto, Bauru. Sou natural de Amparo e, por motivos pessoais voltei pra cá, há sete anos atrás. Montei um bar com cachaça, nesta unidade, nós oferecemos uma carta com setecentos rótulos de cachaça – já tive 1350. Eu gosto de cozinhar, me aventuro no fogão e, sempre que eu ia cozinhar algo tinha uma cachaça do lado do fogão; foi aí que eu tive a ideia de colocar a cachaça no bar, começando com 20 rótulos na prateleira. Porque até então, 13 anos atrás, ninguém conhecia cachaça, como hoje também não conhece – hoje, o mercado está mais abrangente” contou Godoy, confessando que ainda não provou todas as cachaças apresentadas na carta. 

Paulo Godoy é um dos idealizadores do Festival da Cachaça do Circuito das Águas Paulista. “Atualmente realizamos dois Festivais da Cachaça, um no município de Amparo, no mês de agosto e na cidade de Serra Negra, no mês de janeiro”

Por ser um produto artesanal, embora tantos rótulos, nenhuma cachaça é igual a outra, a bebida sempre traz a personalidade do seu produtor. O produto final traz em si, aspectos da variedade da cana-de-açúcar, do solo, do microclima da região, da graduação alcoólica, do armazenamento, da madeira; são fatores que influenciam e que compõem uma bebida. 

A bebida sofreu mudanças ao longo dos últimos séculos quanto à questão de produção, de mercado e de consumo. CACHAÇA é denominação típica e exclusiva da aguardente de cana produzida no Brasil, com graduação alcoólica de trinta e oito a quarenta e oito por cento em volume, a vinte graus Celsius, obtida pela destilação do mosto fermentado do caldo de cana-de-açúcar com características sensoriais peculiares, podendo ser adicionada de açúcares até seis gramas por litro. As denominações possíveis para a bebida cachaça são: cachaça adoçada, cachaça envelhecida, cachaça premium, cachaça extra premium.

“O consumidor de hoje dá valor às bebidas premium, a cachaça premium. Eu não comercializo cachaça se a bebida não estiver registrada no Ministério de Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA). As cachaças premium estão em alta, são os blends, cachaças armazenadas por três, cinco, dez anos em barris; é isso que o consumidor exigente está procurando”, relata Godoy. 

A idéia do Festival da Cachaça do Circuito das Águas Paulista surgiu em 2016.

Festival

O Festival da Cachaça do Circuito das Águas Paulista é composto pelos municípios de Jaguariúna, Pedreira, Amparo, Monte Alegre do Sul, Serra Negra, Lindóia, Águas de Lindóia, Socorro e Holambra – todos compondo o circuito turístico. “A idéia do Festival surgiu em 2016, quando nós pensamos em fazer uma festa da cachaça. Organizei o evento com seis produtores, pedimos a autorização para a prefeitura de Amparo, que fechou a rua pra nós, e pusemos lá, meia dúzia de barracas. O primeiro já foi muito bom. Não parou mais. Atualmente realizamos dois Festivais da Cachaça, um no município de Amparo, no mês de agosto (suspenso por causa das restrições da pandemia da Covid-19), e na cidade de Serra Negra, no mês de janeiro. O Festival acontece com a participação de pessoas que são colecionadores, apreciadores, que vêm de outros estados para participar. A qualidade da cachaça da nossa região é muito boa, temos aqui muitos produtores premiados, vários medalhistas em Bruxelas, na Bélgica; outros premiados na Expo Cachaça – que é a maior feira de cachaça do mundo, em Belo Horizonte, MG -, temos medalhistas no concurso Bebidas destiladas e vinhos”, afirmou. 

Godoy destaca que o Festival se diferencia das demais regiões produtoras porque a região de Amparo possui dez produtores registrados no MAPA, o registro é uma das regras para a participação e, um meio para incentivar o produtor na busca pelo registro da sua bebida. “Na realização do Festival trazemos especialistas, sommeliers, palestras, proporcionamos os cursos para os produtores, nos dois dias. E, neste contexto, o Sebrae abriu os olhos pra nós. No último Festival de Amparo, eles participaram ativamente e aí, em 2021, surgiu a busca pelo Selo de Identificação Geográfica (IG)”, contou. 

Festival da Cachaça em Serra Negra, SP, no mês de janeiro 2020

Selo de Indicação

O Selo de Indicação Geográfica (IG) remete à localização de origem e às condições especiais da fabricação de produtos, permitindo que os consumidores tenham a certeza de que estão adquirindo um produto diferenciado pela qualidade da sua procedência, além de valorizar a cultura local e fomentar atividades turísticas. O registro de Indicação Geográfica é uma ferramenta coletiva de valorização de produtos tradicionais de determinada região. Tem como função principal agregar valor ao produto e proteger a região produtora. Em 2007, o INPI reconheceu a primeira Indicação Geográfica de microrregião produtora de cachaça – Paraty. Na sequência, outras microrregiões produtoras buscaram esse reconhecimento, como Salinas, MG e Abaíra, BA.

“Essas microrregiões não tem o número de alambiques que temos na nossa região, mas, infelizmente, temos a maioria deles na informalidade. O produtor não pode mais moer a cana-de-açúcar na terra, no chão batido, ele tem que ter um lugar limpo apropriado, somente para esse fim, tem que ser de alvenaria com piso frio, azulejado. Ele não pode fazer a fermentação da bebida em dornas de plástico, em bombas de prolipropileno porque o  processo de fermentação corrói a embalagem plástica – as embalagens tem que ser de inox. O processo para formalizar o negócio envolve a Cetesb, a assessoria de um técnico químico que assine o projeto. Só que o informal não pode ter as suas bebidas nas prateleiras de supermercados, não pode participar de concursos, não pode participar de feiras como a nossa, ele até pode fazer um bom produto mas, ele vai viver a vida inteira vendendo a bebida em garrafões pelo valor de 30 reais. Hoje, uma garrafa de cachaça premium de 750ml não custa menos que 50 reais. 

A cachaça de alambique tem um valor equivalente ao uísque, existem cachaças que são superiores ao uísque. Eu já fui consumidor de uísque quando eu era jovem, mas depois que eu descobri a cachaça eu não tomo mais uísque, a qualidade é muito superior. O sensorial da cachaça, o Brasil dispõe de mais de 30 madeiras para armazenar a bebida, como o jequitibá, a umburana, o bálsamo, o carvalho; uma infinidade de madeiras com uma infinidade de sabores”, revelou Godoy. 

Em 2001, o Decreto Presidencial no 4.062, estabeleceu que as expressões “cachaça”, “Brasil” e “cachaça do Brasil” somente fossem usadas pelos produtores estabelecidos no País, constituindo indicação geográfica. Recentemente, o Decreto no 9.658, de 28 de dezembro de 2018 promulgou o Acordo entre a República Federativa do Brasil e os Estados Unidos Mexicanos para o reconhecimento mútuo da cachaça e da tequila como Indicações Geográficas e Produtos Distintivos do Brasil e do México. Reconhecimento semelhante já havia ocorrido como parte do acordo bilateral entre os governos do Brasil e Estados Unidos, firmado em abril de 2012, em contrapartida ao reconhecimento do Bourbon Whisky e do Tennessee Whisky como bebidas elaboradas apenas por produtores dos Estados Unidos, a cachaça passou a ser considerada um produto exclusivamente brasileiro no mercado norte-americano (Anuário da cachaça/MAPA; 2019).

Durante o Festival são realizados encontros com especialistas e sommeliers, além de palestras e cursos para capacitação e promoção dos produtores locais

Conquistas

O trabalho pela busca do Selo de Indicação Geográfica é um dos frutos do Festival, “nasceu dentro do Festival, o que nos deixa orgulhosos, pois, poucos vivem da cachaça, a produção sempre começa como hobbie e quando o negócio começa a despontar o produtor se dedica muito mais ao negócio. Durante o Festival, as reservas dos hotéis se esgotam, temos visitas de todo o Brasil, expositores e produtores de Minas Gerais, artesãos da região, todos os serviços faturam com o Festival”, afirmou Godoy. 

Os produtores de cachaça fazem bebidas mistas ou compostas, cachaça com canela, cachaça com mel, com jambu; são alguns exemplos. Godoy está sempre atento a campanhas e movimentos que enalteçam a bebida, como o 4º Concurso Nacional de Rabo de Galo, que está para acontecer em 13/12/2021. O tradicional drink “rabo de galo” é composto por 70% de cachaça e 30% com o tradicional vermut – o barman pode fazer com qual bebida quiser. “É um drink que apoiamos através do mestre barman Derivan, de São Paulo. Há três anos acontece o Concurso de Rabo de Galo, na capital, patrocinado pelos produtores de cachaça. Acredito que o “rabo de galo” vai explodir como explodiu o gim tônica, recentemente. Os produtores de cachaça também começaram produzir gim de excelente qualidade devido à demanda”, frisou. Mas essa é uma outra história que ficará para a próxima rodada. Saúde!

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