Jornal Pires Rural – Edição 207 | CAMPINAS, Dezembro de 2017 | Ano XII

BRIC – sigla inicial de Brasil, Rússia, Índia e China, criada em 2001 por analistas do mercado econômico, segundo dados, dentro das próximas décadas, esses países ocuparão o topo no ranking das maiores economias do mundo.

O Seminário América Latina, China e Brasil: temas, perspectivas e desafios, aconteceu no Instituto de Economia – Unicamp, com o objetivo de promover uma maior compreensão sobre a China, um assunto que a Unicamp tem promovido realizando seminários temáticos e também, ampliando as relações tanto com o governo brasileiro quanto chinês. Maria Helena Rodrigues, professora de Relações Internacionais da PUC-RJ, há oito anos, segue e discute a participação do Brasil dentro dos Brics. Trouxe para o Seminário a exposição, ‘Qual é o papel dos Brics no contexto internacional, na ordem internacional’.

De acordo com Maria Helena, quando os Brics foram constituídos em 2008 e 2009 vivíamos num contexto internacional bem diferente do contexto que estamos vivendo hoje, e imaginávamos um sistema multipolar e pensávamos que esse sistema pudesse ser mais interessante. “A cartografia que se fazia do sistema multipolar era pensando numa inter regionalidade com regras internacionais claras e a China na liderança. A estratégia que a gente discutia era um crescimento harmonioso muito diferente ao modelo dos EUA, que é uma cartografia mais global – uma ordem que não é imperial mas territorial com hegemonia ocidental – e uma estratégia da democracia do livre mercado. É nesse contexto que os Brics começam a funcionar”, afirmou.
O que temos hoje é que os Brics têm uma recuperação forte mas mantém, uma certa inquietação de qual é o papel da China, hoje, dentro dos Brics, porque a China tem um peso econômico muito grande dentro dos Brics e isso fica maior porque Rússia, África do Sul e Brasil tem um peso econômico, hoje muito pequeno, impulsionado pela queda dos preços das commodities, (minério e do petróleo). Também porque a Índia cresce a taxas elevadas mas, ainda saindo de um patamar que é muito baixo, então, é um processo que demora para chegar a um nível quase parecido com o da China. “Ainda há uma grande divergência, um princípio de conflito entre China e Índia e traz repercussões nas organizações da região. EUA, Japão e Australia tentam atrair a Índia contra os acordos com a China e isso faz com que a Índia fique numa posição muito mais enfraquecida nos Brics”,  ressaltou.

A Rússia atua como um centro político e financeiro e seu posicionamento em cima dos Brics é bem radical, podemos ver na cúpula dos Brics a posição da Rússia em temas como segurança; votação sobre uso de armas e armamentos, fazendo uma pressão grande. “Esses cinco países nunca tiveram tão fora de sintonia, tanto em termos políticos como econômicos. Se pensamos na última cúpula dos Brics, percebemos que tem poucos acordos, poucas manifestações conjuntas sobre temas políticos e as manifestações são quase sempre sobre assuntos econômicos. O que significa que tem um baixo perfil político nos Brics a partir da última cúpula mas, um grande perfil econômico. Isso não significa que esteja ameaçado. Ao contrário, é uma plataforma super importante para o poder da China na globalização e é muito conveniente para os outros países. Além de tudo, porque se pensarmos que hoje a economia chinesa é maior que a soma dos outros países, os Brics é muito importante para a China”, ela admitiu.

No discurso da abertura da nona cúpula Brics, realizada em setembro na cidade de Xiamen, próxima a Taiwan, foi anunciado que a China destinará mais de 240 milhões de dólares a um fundo para trocar experiências e facilitação de comércio e investimentos entre os quatro países do bloco e se falou em explorar o potencial de cooperação entre os países. “Esse posicionamento frente aos outros países é importante para definir qual é o papel hoje dos Brics. Sabemos que a Rússia precisa da China pelas commodities, sobretudo e basicamente pela sua disputa no ocidente, é fundamental esse papel, estar próximo da China e dos outros países. O Brasil precisa da China nas exportações de soja, minério, ferro, o agronegócio é vital para a recuperação econômica, para investimentos para infraestrutura além de privatização, parceria público privada”, destacou.
Segundo a Professora, no que se refere a relação do Brasil com os Brics, o mesmo, às vezes assume um pragmatismo poligâmico com os Brics e ao tentar também ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), na tentativa de reativar acordos comerciais com os Estados Unidos, tentando jogar com todos os atores. “Um fato curioso é que neste último ano tivemos duas visitas de nosso presidente na China, seis visitas de ministros, doze visitas de governadores, 98 visitas de prefeitos à China, ou seja, é uma profusão de visitas com um cardápio de possibilidades oferecendo o Brasil para a China”, observou.

Ela comenta, “no caso da Índia, este país apresenta crescimento econômico e ainda poderia crescer sem a China. Mas, o principal parceiro comercial da Índia são os Estados Unidos e os Emirados Árabes mas, se colocamos em conjunto com a China é o número dois em importação e exportação. As exportações são muito importantes para a China”.
A África do Sul precisa de investimento e compradores da China por causa da matéria prima. A China é o maior mercado de exportação, representa quase 12 bilhões, supera quase todos os outros parceiros comerciais. “Poderíamos dizer que estamos num processo quase de dependência de todos os outros países. Uma dependência frente a China, seja de importação e exportação. A China está num momento sob a liderança do Xi Jinping e se tornou muito mais assertiva e essa consciência de poder amplificada pelo espaço deixado pelos Estados Unidos, na gestão de Donald Trump. Essa liderança é um elemento de efeito profundo para os países dos Brics, porém, não sabemos ainda como vai ser esse relacionamento no futuro, porque a China já não é mais somente um país emergente – ela vai se constituindo como um país super potente. Isso pode tornar-se um desafio tanto para o Brasil e para outros países em como lidar com esse parceiro que é comercial e é muito forte politicamente. Não está muito claro como a China vai exercer esse poder mas, está tentando romper essa letargia dos Brics para que seja um Brics Plus, tentando expandir para outros países emergentes e trazer outros atores próximos”, afirmou.

Para Maria Helena, se pensamos que os Brics começa nessa ordem do neoliberalismo exacerbado e a emergência da China se dá dentro dessa ordem neoliberal, poderíamos dizer que a China modifica essa ordem com descentralização. “Podemos observar isso quando a mesma se dispõe a fazer acordo de Paris e tenta entrar em outras agendas que são importantes. A questão fundamental é que a questão econômica continua sendo o centro gravitacional dos Brics com a criação do Banco de Desenvolvimento dos Brics – um banco de desenvolvimento, que vai abrir uma sucursal em São Paulo e outra no Rio de Janeiro. O que tem tentando fazer é um sistema inter-regional, como se ela fosse um raio da roda da bicicleta e a China criasse um monte de instituições paralelas mas, entre eles nenhum diálogo. Todos estão conectados com a China mas, não podem ter diálogo entre esse acordo, dessas instituições. São múltiplas as iniciativas que a China vai criando, consolidando, mas não tem nenhuma relação entre elas”, demonstrou. As relações construídas são bem diversificadas como a atuação na OCDE e na atuação com a Agenda de Paris. “Essa atuação da China tem trazido algumas discussões e reações em outros campos, por exemplo, um pacote específico para a África. Os alemães também tem um pacote específico para a África, Índia e Japão, se juntam para construir um corredor de crescimento para a África como um contrapeso do projeto de Al Gore e aparece outras grandes repercussões sobre esse posicionamento da África”, apontou. “A gente vê que a China tem uma presença muito forte nos Brics, a partir do posicionamento econômico, de poder econômico e os outros países tem buscado poder político com esse posicionamento deixando que a China tenha um papel fundamental”, concluiu Maria Helena.

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