Fórum Unicamp: Violência, justiça criminal e segurança pública
Jornal Pires Rural – Edição 222 | CAMPINAS, Novembro de 2018 | Ano XIII

Luciana Zaffalon apresentou o projeto inédito, chamado JUSTA, que está sendo construído com uma rede de 7 organizações nacionais e internacionais. “O JUSTA é um projeto que parte das conclusões da minha tese de doutorado, que demostraram relações bastante promiscuas entre o Governo do Estado (Executivo) e sistema de justiça (Tribunal de Justiça, Ministério Público e Defensoria Pública — Judiciário) e de que maneira o papel que a Assembleia Legislativa Estadual faz nesse equacionamento, nos leva a um cenário bastante dramático e afeta diretamente as políticas de segurança pública e prisional”, apontou.

A apresentação ocorreu durante o Fórum permanente “Violência, justiça criminal e segurança pública”, tendo por objetivo trazer a debate todas as discussões judiciais na defesa de direitos humanos, através de instituições judiciais.
A organização desse Fórum foi do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) por meio do laboratório de estudos sobre política e criminologia. O evento ocorreu no campus da Unicamp, em Campinas.

Luciana Zaffalon, doutora em administração pública pela Fundação Getulio Vargas (FGV)

Luciana Zaffalon é doutora em administração pública pela Fundação Getulio Vargas (FGV), supervisora geral do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Ela integra a Secretaria Executiva da Plataforma Brasileira de Política de Drogas e o grupo de estudos e trabalhos “Mulheres Encarceradas”. Luciana teve uma pesquisa importante, que acaba de virar um livro, sobre as relações entre Judiciário e Executivo no Estado de São Paulo, como determinantes nas políticas de encarceramento e cerceamento de direitos.

Um dado destacado pela pesquisa, mostra que os juizes, promotores e defensores públicos estão entre os 0,08% da população mais rica do Brasil. “Comparando com todas as faixas de renda, todos os domicílios que tem renda preparada pela PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar do IBGE), considerando todas as classes de renda, as carreiras jurídicas estão entre os 0,08% mais ricos do país”, afirmou.

Luciana trouxe um vídeo explicativo sobre a plataforma JUSTA, que será lançada na internet em breve (www.justa.org.br). O projeto verifica como a construção de hegemonias tem corrompido as instituições, sua tese de doutorado sobre gestão pública da Justiça, revela ações do Judiciário paulista onde, ao mesmo tempo, atua para blindar a política de Segurança Pública do governo do Estado e negocia a manutenção e a ampliação de seus benefícios corporativos. “Tudo isso é muito abstrato e difícil de juntar um tema com o outro, por isso está surgindo o JUSTA. Se está é a realidade do Estado de São Paulo, a ideia é olhar de que maneira isso acontece por todo país”, declarou.

O vídeo explica didaticamente como o JUSTA atuará e o porquê de sua importância, “esta apresentação tenta expor numa linguagem que as pessoas possam vir a entender, esse tema que é tão caro pra todos”, esclarece.

Áudio do vídeo
Uma voz feminina narra: “A gente sabe que os juizes estão entre as pessoas mais ricas do Brasil e que pra chegar nesse patamar, a maioria deles ganha mais do que o teto (salarial) previsto na Constituição, ou seja, quem deveria aplicar a lei, não anda seguindo as regras, mas como pode?”
“Antes de continuar, vamos ver como funcionam os 3 poderes:
O papel do Legislativo é criar leis que valem para todos. O Executivo é realizar a administração pública respeitando essas leis. O Judiciário é julgar de acordo com as leis, é quem resolve os conflitos da sociedade e também utiliza esse mesmo sistema de governo. Esses três poderes vão atuar de maneira independente para garantir que o poder de um, funcione como freio do outro, evitando desvios”.
“Uma pesquisa feita em 2017 descobriu: durante 4 anos o Governo do Estado de São Paulo enviou ao Legislativo, diversos projetos prevendo vantagens para as carreiras jurídicas como o aumento de remuneração e a previsão dos muitos conhecidos penduricalhos. E advinha? 91% desses projetos foram aprovados. Em troca, o Governo do Estado teve muito de seus interesses protegidos pelo presidente do Tribunal de Justiça (TJ). Para dar um exemplo apenas, o TJ suspendeu as decisões que iam contra o Governo em 93% dos processos que responsabilizavam o Executivo por violações gravíssimas de direitos de pessoas privadas de liberdade e, ficou tudo por isso mesmo”.
“Foi para combater injustiças como essa e investigar relações problemáticas entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, criamos o JUSTA. Focamos nossos esforços nas consequências que essas barganhas entre os 3 poderes, tem na segurança pública e na justiça criminal, porque esses, são dois espaços onde são decididas questões importantes para a sociedade, os nossos direitos e a nossa liberdade”.
“O projeto é pautado pela lei de acesso a informação e usa tecnologia a serviço da transparência para captar dados diretamente dos órgãos públicos. Esses dados são disponibilizados em uma plataforma interativa (na internet) para você ter acesso as informações e possa fazer as suas próprias descobertas”.

“Nossas analises são divididas em 3 eixos:
No eixo Orçamentário: Qual o custo do sistema da justiça criminal brasileira, e o quanto desse dinheiro vai para o salário de juizes, promotores e defensores públicos. Ah! Também damos atenção para como os governos conduzem as aberturas de créditos adicionais para a Justiça.
Eixo Legislativo: Mapeia quais leis estão sendo propostas para beneficiar os interesses das carreiras jurídicas.
Eixo Suspensão de segurança: Investiga as decisões tomadas pelos presidentes dos tribunais em favor dos interesses do Executivo.
Todos eles são permeados por um olhar atento as questões de raça e gênero. Nosso trabalho encontra diversas barreiras de acesso aos dados públicos necessários para entender esse complexo quebra-cabeças mas, nós não desistimos, acreditamos que a informação acessível é o que dá poder ao cidadão para cobrar os seus direitos. Acesse as nossas análises, faça parte, conheça o Justa”, termina o vídeo.

As analises são divididas em eixos:Orçamentário, Legislativo, Suspensão de segurança e Raça e Gênero

Finalizando, Luciana cita, “todas as bases de dados são públicas e estarão disponíveis para consulta, auto manuseio e também para quem quiser ‘rachar’ esses dados e fazer novas pesquisas, construir novas leituras, através dessa plataforma digital que vamos lançar. Sabemos a dificuldade que é obter esses dados, já que estamos fazendo esse esforço, a ideia é que se multiplique a construção de saberes a partir disso. O projeto vai embarcar sete estados do país, vai ser lançado publicamente em dezembro, eu quis apresentar para vocês a metodologia do projeto, qual caminho percorremos e convidá-los a acompanhar esse projeto”, encerrou Luciana.

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