Valendo-se do mês de maio, onde é comemorado o Dia do Trabalhador, trazemos o tema saúde do trabalhador, um direito garantido pela Constituição Federal e pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). A homenagem prestada aos trabalhadores se deve, principalmente, àqueles que saíram às ruas para fazer suas reivindicações frente as condições desumanas de trabalho e, com isso conquistaram direitos que se transformaram em leis trabalhistas.

Assim como o salário é garantido ser pago até o quinto dia útil do mês, os exames médicos de admissão e demissão também são direitos garantido pela CLT. Para relatar sobre a segurança e saúde no trabalho, conversamos com Aroldo Rizzo, diretor administrativo da Prev-Med, técnico em segurança do trabalho desde há época da Portaria nº 3.214, de 8 de junho de 1978, considerada um marco histórico na segurança e saúde do trabalhador. Essa portaria veio estabelecer a obrigatoriedade de elaboração e implementação, por parte de todos os empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados, o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), tanto rural quanto urbano.

Em 1978, o Ministério do Trabalho, por meio da Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho (SST) criava matéria técnica para a elaboração de uma portaria que garantisse ao Brasil uma legislação adequada para a prevenção dos acidentes. Naquele período, a adoção de recomendações em SST vinha de outros países, como por exemplo, dos Estados Unidos.

Em nossa conversa Sr. Aroldo Rizzo relata, “os exames médicos de antigamente eram assim; na maioria das vezes todo mundo se conhecia ao arrumar um emprego. Chegava na empresa, o médico dizia; ‘Ah! Você é fulano, filho de ciclano. Conheci seu pai, como ele está? Você tem algum problema (de saúde)? Não tem dor nenhuma? Então, vai trabalhar. Qualquer coisa você procura a gente’. Depois começou a tal “chapa do pulmão”, que é a radiografia. Normalmente vinha uma Kombi e, se a empresa tivesse 500 funcionários, passava todo mundo para fazer a ‘chapa do pulmão’. Dificilmente alguém aparecia com algum problema. Era uma coisa do tipo ‘vamos fazer por fazer’. Os exames médicos, em 1960, deu uma melhorada pois, começaram a questionar onde você vai trabalhar? O que você vai fazer? Você já teve algum problema? Já sofreu algum acidente de trabalho? Mas ainda era muito fraco. Para se ter uma ideia, quando eu fiz o curso técnico de segurança do trabalho, em 1975, era chamado inspetor de segurança. O trabalho consistia em entrar dentro da fábrica para entender o que acontecia a título de prevenção de acidentes e de doenças do trabalho. Eram verificados os meios de circulação, de proteção de máquinas, as condições elétricas, as condições de prevenção e combate a incêndios, o uso do equipamento de proteção, a realização de treinamentos, o EPC (Equipamento de Proteção Coletiva) e o EPI (Equipamento de Proteção Individual). Foi uma época muito difícil, porque a maioria dos empregadores não viam isso com bons olhos pois, diziam que ‘homem que é homem tem que ter calo na mão, tem que estar com a roupa suja’. Se um mecânico aparecia com a roupa limpa, era muito estranho. Era um trabalhador que chegava em casa imundo, usava dentro da mesma semana a mesma roupa”, descreveu. 

Com o tempo muitos avanços ocorreram no segmento da prevenção dos acidentes de trabalho, contribuindo para que os riscos e perigos intrínsecos às mais diversas atividades profissionais pudessem ser minimizados, a partir das normatizações.

Segundo Sr. Aroldo, “a publicação da lei 6.514 em 1977 e posteriormente da Portaria 3.214 em 1978, dando conta dessa situação, é de dezembro de 1977. Eu fiz o curso em 1975, antes da lei. Em junho de 1978, surgiu a Portaria 3.214, foi essa portaria que iniciou as normas de segurança, as chamadas NR. Hoje, estamos em torno de 36 Normas Regulamentadoras. A legislação de uma maneira geral diz a respeito a inspeção prévia, embargo e interdição e, a parte específica do SESMET (Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho). Cada uma dessas normas tem uma infinidade de artigos explicativos em seus detalhes todos”, observou. 

Aroldo Rizzo diretor administrativo da Prev-Med, “O empregador atendendo as necessidades de solução na área de prevenção, fica muito mais barato pra ele, pois, ele não cuida só da legislação, ele cuida do social”

Profissionais

Aroldo nos relata que a equipe da Prev-Med é composta de enfermeiros, fonoaudiólogos, ergonomistas além dos técnicos, engenheiros e médicos de segurança do trabalho. “Para poder atuar nessa área como médico coordenador de PCMSO, precisa ter o curso de medicina do trabalho, que é um curso, em torno de dois anos, como uma especialização. Pode ser qualquer médico como cardiologista, otorrino ou ginecologista. Do mesmo jeito o engenheiro de segurança, pode ser qualquer engenheiro: civil, mecânico, de produção ou eletricista. Ele também faz uma especialização em segurança do trabalho”, salienta. 

De acordo com a legislação, é uma obrigatoriedade a elaboração e implementação do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA, que tem por objetivo promover a saúde, a segurança e a integridade dos trabalhadores. Sr. Aroldo nos conta que a elaboração do PPRA, hoje chamado de PGR (Programa de Gerenciamento de Riscos) é trabalho do engenheiro de segurança. “Ele vai para a empresa trabalhar em cima desse programa. Cabe ao engenheiro avaliar a empresa desde a porta da frente, passando por todos ambientes internos, chegando as portas do fundo, para elaborar um memorial descritivo. É aí que ele vai identificar se existe máquinas sem proteção, se o corredor tem a medida certa ou está desobstruído, como está o sistema de incêndio, a parte elétrica, se existe proteção coletiva para aquele ambiente, se há a necessidade de EPI, como um óculos, um calçado, um capacete. De posse do material descritivo, com as comprovações da condição do ambiente, através da verificação por equipamentos de medição, o engenheiro do trabalho entrega para o médico do trabalho que vai analisar todo o laudo técnico e sugerir os exames médicos que os trabalhadores deverão realizar, como possibilidade de doenças e, monitorar a situação pelos exames. A função da ‘descoberta’ da anormalidade, do desacordo com a portaria 3.214 é papel do engenheiro de segurança, do técnico de segurança e até do médico”, destaca.

Mas o médico, cuida da parte da medicina, ele pode entrar na fábrica? “Sim. Pode e deve, mas é um papel mais do engenheiro. É bom para o médico entender, quando um funcionário reclamar de uma dor e de alguma contaminação que ele está sofrendo, um problema respiratório, por exemplo. É extremamente importante que o médico vá até a produção para que ele enxergue aquilo que está fazendo com que o funcionário esteja adoecendo. Isso é chamado de Nexo Técnico Epidemiológico, é quando aparece a doença relacionada ao trabalho que a pessoa desenvolve. Exemplo, um funcionário ficou parcialmente surdo devido ao um ruído no ambiente de trabalho em que não foram tomadas nenhuma medida para proteção desse ruído. Se esse funcionário tem o registro em carteira, do trabalho que ele desenvolvia, se existe o documento PPRA/PGR, demonstrando o nível de ruído acima do permitido. Fica demonstrado no exame médico a perda que teve, então, isso caracteriza que ele ficou com a perda auditiva em razão do nível de ruído em que ele ficava exposto diariamente”, explica. 

Na elaboração do Programa de Gerenciamento de Riscos, Sr. Aroldo é enfático ao dizer que “as responsabilidades da equipe dos profissionais da segurança do trabalho (engenheiro, técnico, médico, enfermeiros, fonoaudiólogo, ergonomista) é muito grande. Pode chegar em uma ação de indenização trabalhista, porque de alguma forma não foi monitorado o funcionário e ele adquiriu uma doença do trabalho. E, de alguma forma, o risco ficou de fora do programa. Quando têm esse tipo de problema é caso de indenização, uma ação reparadora de danos, ou seja, foi constatada uma doença e por algum motivo a empresa não instruiu, não treinou, não deu equipamento de proteção, não comunicou a possibilidade ao empregado ficar exposto a situação. O valor do pedido de indenização fica a critério da pessoa, não tem tabela para isso. O INSS tem a tabela dele mas, é uma eterna briga o valor da indenização, por isso existe uma quantidade enorme de ações trabalhistas indenizatórias.

Chamo a atenção para a implementação do programa de segurança do trabalho, ou seja, analisar o documento, ver quais os exames que os funcionários vão precisar fazer, encaminhar os funcionários para fazer os exames de acordo com que está no documento, fazer os treinamentos de acordo com as funções com que eles exercem”, frisou.

Fiscalização

“Vale destacar que portarias editadas em 1994, instituíram a obrigatoriedade para as empresas públicas e privadas elaborarem e implementarem o PCMSO e o PPRA. Por incrível que pareça, ainda hoje, eu bato na porta da empresa para falar da segurança e medicina ocupacional e ao expor algumas situações sobre o PPRA, eu ouço; ‘mas o que é isso? Por que agora eu sou obrigado? Por que antes eu não era?’ Respondo que não era obrigado antes de 1994. Então, muita gente fica naquela condição da fiscalização, esperando vigilância sanitária, Ministério do Público do Trabalho, Ministério da Previdência, tem que alguém bater lá na porta. A fiscalização acontecia muito de vez em quando, porque a quantidade de auditores fiscais é mínima em relação a quantidade de CNPJ existentes. Ficavam mais por conta de acidentes de trabalho, onde a fiscalização tinha que acompanhar. A fiscalização de rotina, a preventiva, digamos, acontecia de uma forma muito lenta. Tem empresa de 20 anos que nunca foi fiscalizada. Então, o discurso de alguns empresários é esse: ‘se algum dia o fiscal vier aqui eu vejo o que faço’. Só que a preocupação não é unicamente atender a legislação, é preciso atender as necessidades de solução na área de prevenção que a empresa oferece pra que não se torne uma constante preocupação de acidentes e com doença do trabalho”, Sr. Aroldo orienta.

PST e a segurança no trabalho na agricultura

Sr. Aroldo ainda frisa que “essas normativas não estão sendo aplicadas apenas em Limeira, isso é a nível mundial. Na história existem aberrações, porque o que interessava era a produção. Os trabalhadores tinham metas de produção absurdas, quase incapaz de serem cumpridas, as máquinas não tinham proteção segura, obviamente que tudo isso chama atenção. Quando perdia um dedo em acidente, o trabalhador se aposentava pelo Inamps (INPS). Hoje, essa condição é um pouco diferente, tem equipamentos mais modernos, sendo executados por comandos de voz, mas há sessenta anos atrás não existia nada disso. Melhorou muito a integração do funcionário à empresa. 

É bom deixar destacado um aspecto da legislação, que ela também abraça a questão rural. O SESMT tem a NR-31 (Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura) com seus campos de aplicação a serem observados na organização e no ambiente de trabalho rural, de forma a tornar compatível o planejamento e o desenvolvimento das atividades do setor com a prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho rural. E, o mesmo trabalho que fazemos para uma metalúrgica também fazemos para as propriedades agrícolas.

Aqui em Limeira, desde o ano de 2000, existe um grupo chamado PST (Programa de Saúde do Trabalhador). Agora, no final do mês de abril, ocorreu uma solenidade na Câmara Municipal de Limeira, em memória às vítimas de acidente de trabalho. Na ocasião foi apresentado as estatísticas de acidente de trabalho, juntamente com uma palestra sobre o tema. Em razão disso, Limeira tem uma lei municipal, onde todas as empresas de assistência médica que atendem acidentes de trabalho ou uma doença do trabalho, são obrigados a preencher um documento (RAAT), com os dados da empresa, do acidentado, a descrição do acidente e enviar ao PST. Em cima desse documento é montada as estatísticas de quantos acidentes teve em Limeira, anualmente. São dados que ficam em posse da Prefeitura Municipal. Os membros que compõe o PST são do Ministério Público, Ministério Público do Trabalho, Previdência, sindicato patronal e sindicato dos empregados, sociedade civil e membros da Prefeitura”, informou.

Doença laboral

“Até tempos atrás tínhamos de 8 a 10 doenças do trabalho, hoje tem mais de 80. O pior da doença ocupacional é que a maioria delas são irreversíveis, não tem cura. Um exemplo simples são as metalúrgicas, que são comuns em nossa região. Metalúrgica é ferro com ferro, são motores ligados, muito ruído e, isso causa uma perda auditiva. Existe limites na norma que impõe uma condição, por exemplo, até 85 decibéis se consegue trabalhar sem o protetor auricular por 8 horas diárias. A partir do momento que esse ruído vai aumentando a quantidade de horas trabalhadas tem que ir diminuindo, o tempo de exposição tem que ser menor. Mas a perda auditiva induzida por ruído, chamada de Pair, é muito lenta. Os exames audiômetro que fazemos aqui, conseguimos identificar se a perda foi realmente causada pelo ruído ou se foi um problema patológico. 

Ainda tem uma quantidade muito grande de empresários que não dá a mínima atenção para a prevenção, vai parar para pensar quando tiver um problema, um acidente grave, uma ação de indenização financeiramente séria, quando é fiscalizada pela vigilância sanitária e o Ministério Público do Trabalho exigindo o ajuste da empresa, a proteção de máquinas, atenção dos programas, quando ele perceber que estará ficando mais caro do que implantar as exigências antecipadamente. 

Outro detalhe, é quê muito dos trabalhadores não se preocupam com a própria saúde, esquecem de usar o equipamento de proteção individual. Esse é um ponto, penso eu, que a legislação nossa peca barbaridade. Porque uma empresa ao contratar profissionais para elaborar todos os programas e ministrar os treinamentos, preocupados com a prevenção e disponibilizando os EPI aos funcionários, nessa hora qual é a obrigação do trabalhador? Usar o EPI. Na minha modesta opinião, se é explicado ao funcionário quais são as obrigações a serem feitas, como agir, um manual de integração, as obrigações a respeitar e, a partir do momento que um trabalhador desrespeitou o procedimento interno, as normas internas, as normas municipais, estaduais e federais, as leis de uma maneira geral, não tem como culpar o dono de uma empresa se a culpa foi do funcionário. 

A proteção tem a tremenda vantagem de beneficiar os dois lados. O empregador respeitando essa condição fica muito mais barato pra ele, pois, ele não cuida só da legislação, ele cuida do social. Tem um funcionário que vai embora para casa, depois do expediente, melhor do que ele chegou, ele vai com saúde, vai contente porque tem trabalho, tem salário, tem cesta básica, assistência médica, tem alguém cuidando dele. Ao passo que acontece um acidente grave, onde a vítima tem que ficar numa cadeira de rodas, na cama, tem que ficar cinco meses internado, ocorre uma amputação, esse prejuízo não é só para o dono da empresa, é um prejuízo para a família, para a sociedade, será uma pessoa a menos para produzir, é uma pessoa a mais para ser cuidada, isso custa muito. Imagina um pai acidentado, tendo duas crianças pequenas, a mãe cuidando das crianças e da casa. Será que vai viver só do salário do INSS por quanto tempo ? Que tipo de instrução ele pode dar aos filhos? Será que vai conseguir oferecer qual leite aos filhos? Essas questões aparecem quando chegam as estatísticas de acidentes e doenças do trabalho, são milhões de gastos por ano, extremamente exagerado, vamos dizer assim”, descreveu.

O que causa  um acidente?

“São milhares de possibilidades. Nós trabalhamos longos e longos anos acreditando no acidente zero, isso é pura utopia, não existe acidente zero. Pode ter numa empresa ou outra, menos acidentes, porque do ponto de vista técnico, o acidente é tudo aquilo que interrompe o andamento normal do trabalho. Descrevo um exemplo no transporte manual de uma quantidade de peças e, uma delas cai. O funcionário ao verificar, não houve nenhum dano a peça, também não machucou ninguém. Então, se não estragou, não sujou, não amassou e ninguém se machucou, foi um acidente? Sim, foi um acidente! Consideramos como acidente porque não era para cair nenhuma peça. Interrompeu o transporte da mercadoria, então, é preciso investigar porque isso aconteceu. Dessa vez não aconteceu nada mas, se cair uma segunda vez? Eu vou esperar até cair e machucar alguém para depois cuidar? Então, porque caiu? Tinha algum obstáculo no caminho? O funcionário assustou porque passou alguém na frente? Alguma razão teve. É preciso consertar para que não aconteça novamente. Foi falta de atenção ou relaxo do funcionário? É preciso conversar sobre o ocorrido e buscar uma solução para não se repetir. Pensando dessa forma, jamais vai deixar de existir acidente. Precisamos ter melhor sinalização, melhor compreensão, mais cuidado e treinamento continuo pois, cada detalhe forma um todo. O medo, a preocupação, essas coisas todas acabam fazendo o funcionário disperso, sem a atenção necessária para o trabalho e isso é uma chance para acontecer um acidente. Na hora da avaliação não existe um item que sobrepõe outro, a parte técnica, a parte psicológica, parte da alimentação saudável. Não tem um item mais importante que o outro. Dou o exemplo de um funcionário que sabe todos os detalhes de operação de uma máquina, fez todos os treinamentos, ele não tem defeito nenhum naquela operação mas, a máquina tem; ela foi mal regulada, está com alguma peças defeituosa, falta manutenção. Não existe uma regra, é um conjunto de boas ações, em todos os sentidos, para que seja possível diminuir a quantidade de acidentes ou até mesmo diminuir a gravidade dos acidentes.

A gravidade de um acidente só enxergamos quando morre alguém, tem um prejuízo material e financeiro muito grande mas analisando, por outras tantas vezes aconteceu um acidente e ninguém tomou providência, não corrigiram a situação para evitar se repetir com maior gravidade”, complementa.

Para finalizar Sr. Aroldo destaca, “na verdade essa área de medicina do trabalho jamais cairá. A necessidade de melhorias na legislação não vai acabar nunca, por mais que hajam alterações de tecnologias e aprimoramento sempre vai precisar de trabalhadores portanto, o risco de acidentes sempre vai existir”.

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